Hospitais federais no RJ precisam de mudanças de gestão. Crivella aponta circunstâncias que agravam a crise
A situação dos hospitais federais do Rio de Janeiro é crítica e urge mudanças na gestão dos profissionais e dos recursos. Foi a conclusão da audiência pública em que a Comissão de Assuntos Sociais analisou a crise que levou à greve dos servidores, inclusive médicos, desde maio. No encontro, o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) enumerou circunstâncias que agravam a crise dos seis hospitais localizados no município: a violência na cidade, que gera 100 mil casos de lesões corporais dolosas por ano; a falta de diálogo entre o governo estadual e os profissionais da saúde; a falta de investimentos na área e a defasagem dos salários de médicos.
Na pauta das reivindicações, os médicos federais pedem melhores condições de trabalho e a redução da jornada de trabalho para 30 horas. Também querem revisão do plano de carreira e de salários.
Na audiência, o representante do Conselho Federal de Medicina, Sidnei Ferreira, disse haver 8 mil pessoas aguardando cirurgia na metrópole. Outras dificuldades são a falta de medicamentos e de espaço e leitos nas emergências – o que gera um tratamento médico insatisfatório e que alonga a permanência de 30% dos pacientes além do tempo necessário se houvessem sido bem cuidados desde o início da internação.
Sidnei lamentou que leitos estejam sendo fechados, assim como salas cirúrgicas. “Diariamente cerca de 200 pacientes correm o risco de morrer em decorrência de falta de leitos ou de tratamento adequado”.
Carreira
De acordo com Sidnei Ferreira, os médicos estão mantendo os hospitais abertos mesmo recebendo vencimento inferior ao de todos os outros servidores federais. Por um erro no plano de carreira, o salário deles teria sido reduzido dois anos atrás. Com isso, alguns ganham R$ 1,6 mil para trabalhar 20 horas nos hospitais federais.
Na avaliação de Jorge Darze, representante da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), é a primeira vez na história da República que a categoria de médicos é a que menos recebe entre os servidores públicos federais, Ele mostrou contracheques que revelam “uma política discriminatória” contra os médicos, que recebem gratificações menores que os enfermeiros que os auxiliam.
“Ganhamos menos do que qualquer outro profissional de nível superior na administração pública federal. Buscamos ter uma carreira que lhe ofereça expectativa de crescimento. Muitos já desistiram do concurso”.
Greve
Jorge Darze ainda minimizou a atual paralisação dos médicos frente à posição do poder público sobre o caos da saúde.
“Pior que a greve do trabalhador é a greve do poder público. Quando morre um cidadão em decorrência do caos da saúde pública, ninguém responde criminalmente por isso. Não é possível aceitar a decisão de criminalizar uma greve de médicos e ao mesmo tempo deixar passar os problemas de gestão que levam cidadãos à morte”, comparou.
Presente ao debate o senador e também médico Paulo Davim (PV-RN) reiterou a defesa da categoria dizendo que os médicos servidores são submetidos a uma carga de stress além do suportável, lugares insalubres e dificuldades de toda ordem. Ele alertou que tem aumentado o índice de tentativas de suicídio entre os profissionais de saúde.
Davim reclamou da posição do Ministério Público ao pedir a inconstitucionalidade do movimento paredista.
“Mesmo o movimento tendo uma pauta absolutamente legítima, o Ministério Público conseguiu limiar na Justiça para acabar com a greve quando deveria ter é uma postura de contribuir pelo diálogo, mais do que propriamente exercer a autoridade institucional”, criticou.
Em resposta, o procurador do Trabalho Ruy Fernando Cavalheiro disse aos debatedores que a atuação do MP contra a greve se dá para resguardar o direito da população de ser atendido num serviço tão essencial quanto à saúde.
“Mas sempre que é possível a solução amigável, esse é o caminho tomado. A mediação é um ponto constante do MP nos conflitos”, ponderou.
Terceirização
Durante a audiência pública, promovida pela Comissão de Assuntos Sociais e presidida pelo senador Waldemir Moka (PMDB-MS), foram feitas críticas à recém-criada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. Na opinião do médico Jorge Darze, ela seria o instrumento de terceirização da responsabilidade pela saúde no país.
“A crise dos hospitais federais do Rio não é só deles, mas também dos hospitais universitários. A expectativa é a entrega dessas unidades para a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, que pode se tornar a grande gestora das unidades estaduais e municipais – disse.
De acordo com Darze, “o que está embutido no projeto é levar os hospitais à asfixia e só restar entregá-los à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, cuja lei de criação está tendo a constitucionalidade questionada no Supremo”.
Fausto Pereira dos Santos, secretário de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde, garantiu que a ideia não é essa. Ele lembrou que a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares é uma empresa pública, 100% ligada ao Sistema Único de Saúde (SUS) e tem mecanismo de gestão celetista.
Fausto Pereira dos Santos fez um apelo à população para que pressione para que os papéis de cada um desses hospitais no sistema de atendimento do Rio seja melhor definido pelo estado e pelos municípios. A falta de integração entre as três esferas da administração – federal, estadual e municipal –, segundo o secretário, compromete a gestão das instituições.
“Praticamente todos os hospitais federais foram repassados para a gestão de estados e municípios nos anos 80 e 90, menos os do Rio pela particularidades da rede, pelo fato de ser uma ex-capital nacional. Mas o ambiente político é bastante complexo no Rio, onde o SUS não se articulou totalmente entre os três entes da federação. A unidade do sistema, que foi atingida em outras metrópoles, ainda não se fez no Rio”, constatou.
Patrimônio
Além dos hospitais universitários, agora abarcados pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, há três hospitais federais no Rio Grande do Sul e seis hospitais gerais federais do Rio de Janeiro, além de três institutos nacionais, como o Instituto Nacional do Coração (Inca).
Dados levantados pelo diretor de assuntos parlamentares da Associação Médica Brasileira (AMB), José Luiz Mestrinho, o Brasil investe 8,4% do produto interno bruto (PIB) em saúde, sendo 55% em hospitais privados e 45% em públicos. Ele esclareceu que 150 milhões de brasileiros dependem exclusivamente do SUS, o que requer muito mais investimento.
Sobre os salários pagos aos profissionais, Mestinho apontou casos graves como o da Bahia, onde o salário de um médicos chega a ser de R$ 800 pela jornada de 20 horas.
Fonte: Agência Senado